Marco Florentino
Em prosa e verso
Textos
A VOLTA DOS ESPECTROS
A VOLTA DOS ESPECTROS

            Era sábado, era dia... era dia de euforia. Os espectros de um passado remoto trazidos novamente pelo vento leste se encontraram mais uma vez com os de um passado recente. Estes, por ainda estarem vivos, reuniram-se virtualmente na lembrança de um só que, apesar de presente fisicamente, também já era um espectro daquele longínquo dia de 2007, cumprindo assim a afirmação milenar de Heráclito.

            Estava acompanhado das mais importantes e necessárias parceiras e cúmplices da sua vida. Tinha outra motivação que o impelia a essas lembranças... era 08 de Dezembro, de Nossa Senhora da Imaculada Conceição. Há 35 anos se formava discípulo de Hipócrates.

            A praça também mudou, talvez para pior, assim como o bar café que foi e ainda é o único palco do encontro de mesas, cadeiras e garrafas a serviço de criaturas sedentas de alegrias, conversas pra se jogar fora, brindes entre amigos ou até mesmo solitários goles da cevada na tentativa vã de esquecer o presente.

            Num agrupamento de mesas sem toalhas quadriculadas, no calçadão da praça em frente ao bar, sob a vista silenciosa e petrificada da imortal Raquel e dos grandes felinos que a protegia, alguns cidadãos comuns bebiam, riam e conversavam gritando ao som de canções que faziam o gradiente entre a mais refinada musica popular brasileira e o mais miquelino e sofrido brega de todos os tempos, criando uma atmosfera de descontração em que todos, direta ou indiretamente, participavam do auspicioso encontro, seja bebendo em mesas próximas, seja passando na pulsante ágora apenas por passar ou em busca de artigos, presentes, objetos e compras em geral nessa época de maior movimento pela proximidade do natal.

            Quanto a esses peregrinos, desfilavam como numa passarela apresentando toda a variação de tipos e padrões possíveis de um ser humano: o mendigo de barba longa e suja que contrastava com seu esquálido corpo à procura de um local para dormir; o casal de hippies com seus trajes despojados, tatuagens vistosas e cabelos rastafári; a família numerosa com seus infantes irrequietos; as mocinhas assanhadas e sorridentes com suas vestes chamativas; o vendedor ambulante e sua conversa de ¨cerca - lourenço¨; os livreiros ansiosos dos sebos circundantes; o velhinho solitário no banco da praça; a biscate abjeta com sua roupagem indecorosa e língua tortuosa, enfim, tudo o que pode ou não ser imaginado em forma de gente.
  
            Todo esse frenesi acontecendo ao redor da Academia Cearense de Letras, do Museu do Ceará, da Igreja do Rosário e outros prédios centenários da ¨belle epoque¨ de Fortaleza. Assim é a praça pública e é isso que a torna interessante e pitoresca.
  
            Entretanto, os fantasmas da antiga General Tibúrcio, principalmente os velhos padeiros, devem não ter gostado do que viram. Aos poucos foram indo embora juntamente com os novos padeiros e seu protagonista criador.

            Era sábado, era dia. Aquele momento ligou o que aconteceu ao que acontecia.

Marco Antônio Abreu Florentino
Marco Florentino
Enviado por Marco Florentino em 10/12/2018
Alterado em 18/01/2019
Comentários