HEIDEGGER X HABERMAS: UMA DISCÓRDIA FILOSÓFICA
AOS INTERESSADOS EM FILOSOFIA: Interessante palestra da professora Bárbara Freitag Rouanet, da Universidade de Brasília, sobre os contrapontos da filosofia de Heidegger e sua analítica existencial, com Habermas, reconhecidamente marxista, com suas variantes, da Escola de Frankfurt, tendo como premissa básica o fato histórico da adesão daquele ao Nacional Socialismo Alemão (Nazismo) durante os anos da ascensão de Hitler, da segunda grande guerra e do período pós guerra, onde se coloca em questionamento a possibilidade e provável influência ideológica do autor de ¨Ser e Tempo¨ nas suas respectivas obras filosóficas e até mesmo como influência direta no pensamento do povo alemão e sua juventude em particular. Desde já deixo claro minha admiração ao pensamento filosófico Heideggeriano e dedicação aos estudos da sua obra, sendo desnecessário, creio, reafirmar que não simpatizo ou apoio o nazismo, principalmente as aberrações indizíveis e hediondas de suas consequências históricas... o holocausto.
Marco Antônio Abreu Florentino
HABERMAS E HEIDEGGER: UMA DISCÓRDIA FILOSÓFICA. REFLEXÕES SOBRE OS CADERNOS NEGROS DE HEIDEGGER.
Barbara Freitag Rouanet**
** Professora emérita da Universidade de Brasília (UnB), onde lecionou por 30 anos.Tem experiência na área de sociologia, com ênfase em teoria sociológica, cidade e literatura. É membro da Academia Brasileira de Filosofia (2013). <revistasol@unb.br>.
Abertura
Estou extremamente comovida e feliz em estar nesta mesa e neste novo auditório do Departamento de Sociologia da Universidade de Brasília, para pronunciar algumas palavras para o início das aulas deste segundo semestre de 2015!
Quero, de início, exprimir os meus agradecimentos aos organizadores deste evento. Meu muito obrigada vale para a instituição (UnB/Instituto e SOL) mas se dirige especialmente às pessoas que com seu esforço e seu empenho conseguiram trazer-me aqui: abraço especial para o Brasilmar Ferreira Nunes, chefe do Departamento, para o Fabrício Neves, atual coordenador da pós-graduação, para o Sérgio Tavolaro, coordenador da graduação, Márcia Araújo, secretária do Departamento, que teve todo o trabalho logístico. Obrigadíssima à professora Maria Francisca Pinheiro Coelho, pela acolhida, para o colegiado que votou em favor de minha vinda, sem esquecer essa plateia tão interessada de alunos e ouvintes.
Estou muito contente em estar aqui com todos vocês que me fazem recordar os anos em que me esforcei em colaborar com a ideia original de Darcy Ribeiro, que queria fazer da UnB um centro irradiador de ideias científicas e teorias novas, que se difundissem pelo país afora e ajudassem a concretizar o modelo universitário renovador, apoiado em princípios de liberdade e fraternidade, inspirados no conceito de universidade de Wilhem von Humboldt, modelo este que aprendi a conhecer em Berlim, durante minha longa estadia de dez anos, naquela cidade.
Pretendo abordar neste trabalho, no tempo de fala que me foi concedido, três tópicos entre si interligados, da matéria apresentada em minha posse recente na Academia Brasileira de Filosofia (ABF), em junho de 2015, no Rio de Janeiro:
A controvérsia política e filosófica entre Jürgen Habermas, um dos grandes filósofos e sociólogos vivos da contemporaneidade, e Martin Heidegger, o autor de Sein und Zeit (1927), que, em 1933, aderiu abertamente ao nazismo. No tópico II tentarei justificar essa escolha do tema, bem como minha opção de estudar em Frankfurt com Adorno, Horkheimer e suas equipes de assistentes, entre eles Jürgen Habermas.
Nesse relato retrospectivo de minha formação acadêmica (da graduação ao mestrado, doutorado e pós-doutorado), procuro justificar minha fascinação pela Teoria crítica da Escola de Frankfurt e por Berlim, deixando de lado Freiburg/i.Br e Heidelberg.
Essas reflexões foram desencadeadas pela publicação recentíssima (a partir de 2013) dos chamados Cadernos negros de Martin Heidegger, liberados para um público leitor do século XX, depois de sua morte (1976) e que somente agora estão acessíveis, em língua alemã.
A origem da discórdia filosófica entre Habermas e Heidegger
A discórdia filosófica entre Habermas e Heidegger teve origem na Alemanha Ocidental no período do pós-Guerra, ainda durante a ocupação dos aliados que, em 8 de maio de 1945, levaram o regime nazista à capitulação. A Alemanha nazista, como é sabido, exterminou mais de seis milhões de judeus, assassinou ciganos e opositores políticos do regime em campos de extermínio, sem contar os mortos da população civil dos países ocupados.
Enquanto Jürgen Habermas (1929) completava 16 anos na zona de ocupação americana e começava seus estudos de filosofia em Düsseldorf, Heidegger (1889-1976), já com 46 anos, tinha sido professor titular e mesmo reitor na Universidade de Freiburg/i.Br (1933-1934), então sob a administração dos ocupantes franceses, que passaram a administrar a região da Floresta Negra. Uma Comissão de inquérito instaurada pelo exército francês de ocupação, em 1946 (em sua maioria composta por professores universitários alemães), decidiu aposentar Heidegger compulsoriamente, proibindo-o de lecionar e publicar textos e livros por tempo indeterminado. Suspensa a proibição em 1953, Heidegger conseguiu republicar, nesta data, um ensaio sobre "A origem da metafísica", de 1934, na Frankfurter Allgemeine Zeitung, sem qualquer alteração do texto original e nenhuma referência ao período da Guerra, o nazismo e o antissemitismo, que tinham reinado entre 1931 a 1945. Habermas, naquela ocasião com 24 anos e recém-graduado em filosofia, escreveu um protesto no mesmo jornal, ocupando praticamente uma página inteira, reclamando da ousadia do autor de Sein und Zeit e fazendo críticas contundentes à atitude de Heidegger. Habermas exigia de Heidegger pelo menos uma explicação de por que aderira ao partido nazista - National Sozialistlische Deutsche Arbeyter Partei -, de por que jamais se manifestara contra a violência e matança dos judeus, e até 1953 nunca fizera um mea culpa ou um pedido de desculpas aos alemães por tê-los incentivado a seguir a política de Hitler e a praticar os crimes de guerra, pelos quais a população alemã teria de pagar um elevado preço moral e financeiro até o final do século XX. Essa crítica foi ignorada por Heidegger, que não se manifestou publicamente sobre o assunto. E autorizado a retomar seu projeto de publicar suas aulas de períodos anteriores, providenciou a reedição de seu livro (antiga tese), parte de seus seminários e textos novos (como Carta sobre o humanismo). No entanto, jamais voltou à sala de aula.
Em 1987, Habermas publicou uma série de "lectures", palestras dadas nos Estados Unidos, na França e, posteriormente, publicadas também na Alemanha sob o título O discurso filosófico da Modernidade. Essa coletânea contém uma crítica ainda mais virulenta contra Heidegger, por jamais ter se manifestado sobre os anos sangrentos da Segunda Guerra e mais, por ter reeditado, de forma maquiada, seus seminários e aulas do período de 1924 a 1945, apagando em parte os traços mais óbvios de antissemitismo, nazismo, ou tentando deletar qualquer responsabilidade por ter - enquanto membro do partido judaico - denunciado colegas por sua ascendência judaica e cobrado da juventude de então a adesão cega e sem questionamentos ao Wehrdienst, ao Arbeitsdienst e ao Wissensdienst (serviços prestados à guerra, ao trabalho e ao saber, salpicado de termos nazistas). Ao criticar abertamente os pós-estruturalistas - de Foucault e Lyotard a Derrida -, Habermas acusa Heidegger de ter influenciado o surgimento dos "novos-conservadores" e reforçado sua adesão ao niilismo, ao irracionalismo e antimarxismo.
Martin Heidegger faleceu em 1976 e, após a sua morte, começaram a surgir publicações como as de Hugo Ott (Martin Heidegger: Unterwegs zu seiner Biographie,1988) estudioso de documentos inéditos dos arquivos da Universidade de Freiburg; Victor Farias, que fizera um levantamento exaustivo em todos os arquivos disponíveis para escrever sua tese de doutorado "Heidegger e o Nacional-Socialismo" (1992), e, mais recentemente, o estudo de Emmanuel Faye A introdução do nazismo na filosofia (tradução de Luiz Paulo Rouanet, lançado em 2015). Neste livro, Faye examina um seminário realizado por Heidegger em pleno período de ascensão de Hitler, no qual seu engajamento pró-nazista fica evidente. Nesse contexto, Habermas, já renomado e conhecido por sua Teoria da ação comunicativa (1982), dispõe-se a escrever o prefácio da versão alemã do livro de Victor Farias. Se, no início de suas críticas, Habermas tentava separar o homem do filósofo Heidegger, a partir da década de 1980, quando novos textos heideggerianos começam a aparecer, os sinais começam a se inverter: até onde poderia ser verdade, o que já se afirmava há algum tempo, que o grande "mestre do pensamento alemão"1 não somente era um nazista desde o começo da década de vinte, mas, possivelmente, poderia ter se inspirado em Mein Kampf (de Adolf Hitler, publicado em 1924)? Será que Sein und Zeit (publicado em 1927) poderia ter-se inspirado no texto de Hitler (Mein Kampf) para - em uma linguagem filosófica "nacional-socialista" - divulgar as ideias e os preconceitos nazistas do Führer!?
Minha formação acadêmica na Alemanha Ocidental (1961-1971)
Admito que meu ceticismo com relação a Heidegger teve sua origem na Alemanha, no momento em que lá cheguei (em 1961) para dar início aos meus estudos universitários. Muitos dos meus professores e colegas alemães desenvolveram certas reservas sobre a obra heideggeriana a partir dos anos 1950, o que não era o caso dos filósofos brasileiros, que até mesmo tinham estudado com o "mestre" de Todnauberg, na Floresta Negra. Lembro-me de Benedito Nunes e de vários outros filósofos brasileiros, como Carneiro Leão, Ernildo Stein e tantos outros. Um caso especial foi o de Fausto Castilho, que dedicou 30 anos da sua vida para estudar alemão, voltou a estudar grego e latim e confessou ter sido obrigado a recriar sua competência gramatical e linguística do português para lançar a edição bilíngue de Sein und Zeit - Ser e Tempo, de Heidegger, em São Paulo (2012). Simplesmente o trabalho e estudo de toda uma vida! Procurado pela TV Univesp, Castilho não encontrou palavras para a pergunta que agora aflige a todos: a adesão de Heidegger ao "movimento" nacional-socialista durante os anos 1930-1945 e seu antissemitismo explícito teriam contaminado o seu pensamento e a sua obra? Sua filosofia teria escamoteado a percepção do Holocausto e contribuído para a "Shoa" nos campos de extermínios na Europa, comandados por Hitler?2
Durante os meus estudos de sociologia, psicologia e filosofia na Universidade de Frankfurt e mais tarde, em Berlim, na Freie Univesität (1961-1967), falar de Heidegger e de sua obra não era considerado "politicamente correto". Nossas leituras, seminários e trabalhos de curso versavam sobre temas weberianos: a sociologia das religiões, economia e sociedade, a neutralidade das ciências em geral e das ciências da sociedade em especial, a objetividade da pesquisa social e do conhecimento. Theodor W. Adorno e Max Horkheimer, diretores do Institut für Sozialforschung, tinham acabado de voltar dos Estados Unidos para onde haviam fugido da perseguição nazista na década de 1930, perdendo seus cargos e suas funções, seus livros e bens, sendo obrigados a recomeçar a vida. Contudo, à luz da redemocratização na Europa e da emergência do macarthismo nos Estados Unidos, preferiram voltar para a Alemanha, de preferência para o lado ocidental, dos vencedores ingleses, americanos e democráticos. A parte ocupada pelas tropas francesas em 1945 foi a região da Floresta Negra, onde se encontrava a Universidade de Freiburg/i.Br. e onde até essa data "reinava" Martin Heidegger. Ali ele tinha sido nomeado reitor (1933-1934). Em sua fala de posse (Rektoratsrede), seus cursos, suas aulas e em discursos públicos, Heidegger tentou ganhar a adesão dos estudantes em favor da "grandeza do movimento" (subentendido "o movimento nacional-socialista") e "sua verdade intrínseca". Como já foi mencionado, o Comitê de Desnazificação da Universidade Alemã, instalado pelos Aliados, decidiu afastar Heidegger temporariamente de sua função docente, impedindo-o de publicar sua obra. No Brasil, Heidegger foi "cassado" e proibido de escrever ou falar em público entre 1945-1951. Mesmo assim, e talvez por isso mesmo, sua obra exercia forte atração sobre descendentes de emigrantes na Argentina, no Brasil e em outros países latino-americanos, que passaram a mandar seus filhos para Freiburg depois de finda a Segunda Guerra, para respirar a aura do "mestre"3.
Pude matricular-me na Goethe Universität, em Frankfurt, em 1961, pois parte da família ainda vivia nessa região, onde encontrei facilmente uma vaga graças ao meu domínio do alemão e minhas boas notas no Brasil. Já no início de minha graduação, recebi "dicas" de colegas segundo os quais eu deveria assistir os cursos e seminários de Horkheimer, Adorno, Habermas. Entre outras ofertas fui alertada para acompanhar uma pesquisa empírica de importância, "Student und Politik", coordenada por Adorno, Habermas e outros4. Essa pesquisa levantou dados sobre a consciência política dos universitários que retomaram os estudos na cidade natal de Goethe, na maioria filhos de nazistas, buscando conhecer suas motivações, seu eventual antissemitismo, seus preconceitos racistas, seu potencial democrático, revolucionário. A pesquisa estava inspirada no estudo do qual participara Adorno na Califórnia, intitulado "A personalidade autoritária" (1950), que, por sua vez, retomava as pesquisas empíricas sobre "Autoridade e família", iniciada na década de 1930 no Institut für Sozialforschung por Horkheirmer, Marcuse, Pollock, Wittvogel e outros, interrompida, com o advento do nacional-socialismo e a perseguição dos judeus na Europa.
Friedrich von Friedeburg deu continuidade a esses estudos e a suas técnicas em uma ampla pesquisa entre estudantes de Berlim ocidental, na Freie Universität, razão para muitos de nós solicitar a transferência de nossa matrícula de Frankfurt para Berlim (Ocidental), depois de Adorno (1969) e Horkheimer (1972) se aposentarem. Neste clima que deu origem aos movimentos estudantis de Rudi Dutschke e do franco-alemão Cohn-Bendit, não havia "campo" nem vez para a filosofia hermenêutica, existencialista ou niilista de Heidegger. A partir do final da década de 1950, este voltou a se manifestar, reeditando suas aulas dos anos 1930-1940 e reformulando suas ideias de Sein und Zeit em uma "Spätphilosophie", registrada em sua Carta sobre o humanismo, dirigida a um colega francês, Jean Beaufret. A leitura ocasional de "O que é a metafísica"? ou "O que é a verdade"? Questões sobre o "Sein", "Seyn", "Da-Sein", "In-die-Welt-Geworfen-Sein" nos pareciam mais jogos de palavras do que propriamente preocupações autênticas em torno da reconstrução das cidades em ruínas, das famílias dizimadas na e pela guerra, da "Wiedergutmachung" (reparações materiais, espirituais, morais) dos sobreviventes do Holocausto.
Theodor W. Adorno nos divertia com suas análises linguísticas em "Jargon der Eigentlihkeit"5, que em verdade faziam uma crítica feroz ao jargão heideggeriano, mas que para nós, geração "pós-heideggeriana", passavam a sensação do conto de Hans Chistian Andersen: "Des Kaisers'neue Kleider", em que uma criança exclama inocentemente: "Mas o Imperador está nu!"
Certamente éramos uma geração irreverente e parte dela até mesmo "revolucionária" como a Rote Armee Franktion (RAF), que marcou o "movimento de maio de 1968", bem diferente daquele intencionado pelos nazistas. Para nós, Theodor W. Adorno passou a ser o modelo do pensamento filosófico crítico aderindo à sua "Dialética da ilustração", "Dialética negativa", "Aesthetische Theorie". Ouvíamos suas falas na Rádio e na TV sobre "Theorie der Halbbildung", "Nie wieder Auschwitz" e tentávamos obter cópias das músicas dodecafônicas nos moldes de Berg e Schönberg, que compunha para melhor entendermos sua teoria e crítica da música, como último reduto de protesto contra a sociedade contemporânea.
Max Horkheimer nos encantava com seus cursos sobre os clássicos gregos, dos pré-socráticos, aos diálogos platônicos, da Paideia à Ética a Nicômaco, dos autores de epopeias e tragédias, de Homero a Sófocles e Eurípides. O mundo cinzento das ruínas das cidades bombardeadas de Frankfurt ou Berlim, em fase de reconstrução, pareciam iluminar-se. Horkheimer insistia no resgate da razão e na "aufklärung", que, como em português, tinha um sentido duplo: "clarear" (o mau tempo) e "esclarecer" as dúvidas que o passado recente nos impusera.
Quando Herbert Marcuse6 vinha da Califórnia, animava-nos durante os chamados "Universitätstage", falando do Homem unidimensional, mas também de Eros e civilização, da retomada do amor e fazia crítica aos excessos de repressão e recalque que a cultura burguesa das sociedades capitalistas e socialistas impunham aos indivíduos da contemporaneidade. Marcuse, doutorando orientado por Heidegger, esclarecia ainda que havia trocado cartas com Heidegger (no final da década de 1940), cobrando-lhe explicações quanto ao seu envolvimento com os nazistas desde 1933 e o reconhecimento da culpa dos alemães, sugerindo que fizesse - em nome dos alemães sobreviventes - um pedido de desculpas por ter sido omisso diante do Holocausto que marcou o assassinato de milhões de pessoas durante a Segunda Guerra Mundial. Mas, como pudemos ler em uma carta-resposta de Heidegger a Marcuse, isso não aconteceu...7
Na década de 1970 Habermas passou uma temporada na New School for Social Research, em Nova York, universidade onde lecionavam Hannah Arendt, Hans Jonas, Richard Bernstein, entre outros. Essa experiência valeu-lhe o reconhecimento dos filósofos americanos, dos quais se tornaria colega, amigo e interlocutor nas décadas seguintes: Richard Rorty, John Rawls, Lawrence Kohlberg, e outros, abrindo os horizontes de várias outras disciplinas, como a psicologia, a linguística, o direito, a sociologia (ver Talcott Parsons e C. W. Mills, Searle, Austin) para a Teoria crítica. Habermas voltou e permaneceu na Alemanha, onde assumiu, na década de 1980, a cátedra de filosofia no Institut für Sozalforschung e depois no Departamento de Filosofia da J. W. Goethe Universität, de Frankfurt.
Para a minha geração, Habermas e sua obra passou a ocupar um lugar central em nossas reflexões. Ele era o verdadeiro herdeiro do pensamento adorniano, ou o filósofo que melhor absorvera os ensinamentos dos grandes mestres do pensamento crítico e avançara na reflexão inovadora da teoria da Modernidade sobre a sociedade contemporânea, pós-guerra, pós-Auschwitz.
Em sua Teoria da ação comunicativa, Habermas (1981) desenvolveu uma teoria da sociedade calcada em um novo conceito de razão, a razão comunicativa. A sua teoria parte de um conceito de sociedade que abrange a ótica do "sistema" (visão objetiva, externa, da sociedade) e a ótica do "mundo vivido" (visão subjetiva, interna); ao mesmo tempo, o autor procura explicar a gênese da moderna sociedade ocidental, diagnosticar suas patologias e buscar soluções para a sua supressão e superação. A Teoria da ação comunicativa vai além das teorias evolutivas simplificadoras de Comte, Spencer e Darwin por compreender os processos de transformação das formações societárias como processos coletivos de aprendizagem. À semelhança dos processos da psicogênese infantil (de Piaget), as sociedades modernas têm capacidade de aprender e alargar cada vez mais seus horizontes, reestruturando sua consciência social, moral, linguística e racional. Assim sendo, as sociedades superam processos de organização mais simples e menos eficazes em favor de processos mais universais, mediante sucessivas descentrações. Nessa forma de evolução são superados os princípios de organização do parentesco, do mercado (organizado em torno do trabalho e do capital), do Estado (nacional) em direção ao Estado supranacional, mediante a introdução de processos argumentativos, baseados em "discursos" que buscam novas soluções, chegando a novas descontrações. As novas formações societárias, cada vez mais complexas, aprendem a implementar sucessivamente princípios de universalização que permitem uma maior diferenciação e autonomização das diferentes esferas societárias.
A passagem de um patamar de estruturação em torno de um princípio de organização para o seguinte vem acompanhado de crises. A descentração de um padrão de organização significa, via de regra, o desprendimento de um princípio particular em favor de um princípio de maior universalidade.
Segundo Habermas, a "Modernidade" refere-se às formações societárias do nosso tempo; dos "tempos modernos", marcados por três eventos históricos ocorridos na Europa: a Reforma Protestante, o Iluminismo e a Revolução Francesa. Assim, Habermas localiza a "Modernidade" no tempo (século XVIII ao século XXI) e no espaço (Ocidente, ou seja, a Europa). Fazem parte dessa "Modernidade" as sociedades de classe do capitalismo liberal e "tardio" (Spätkapitalismus) e as sociedades de classe do socialismo de Estado (Staatssozialismus), duas variantes de formações societárias de classe, diferenciadas em Estado e economia.
Habermas distingue os processos de modernização sistêmica (racionalização do Estado político e da economia de mercado) dos processos de modernização cultural, que estariam se dando no interior do "mundo da vida" (Lebenswelt) e abrangendo as esferas de valor da moral, da ciência e da arte, das quais falava Weber. Assim, afirma que o mundo sistêmico é regido pela racionalidade instrumental, necessária para a reprodução material da vida na sociedade. O mundo sistêmico dispensa a ação comunicativa pois recorre ao dinheiro no interior dos subsistemas econômicos; enquanto o subsistema do Estado, recorre ao poder. É no contexto do "mundo da vida" que sobreviveu a razão comunicativa, que recorre à argumentação e ao discurso e promove a reprodução simbólica da sociedade. Aqui podem ser questionados os valores da arte, da moral e da ciência, nichos societários que (ainda) permitem buscar autonomia e defender a emancipação, por seu grau de liberdade historicamente conquistado. Enquanto o mundo sistêmico garante a "integração sistêmica", o mundo da vida garante a "integração social". No primeiro, a racionalidade e a ação instrumental são hegemônicas; no segundo, a ação e a racionalidade comunicativa ditam as regras. Como Habermas vê no sistema uma forma necessária de sobrevivência, pode-se argumentar que esses dois subsistemas da formação societária moderna têm função de "redução de complexidade" (Luhmann), pois não é possível renegociar todas as relações sociais permanentemente a partir da estaca zero. A introdução da perspectiva do "mundo da vida" (Lebenswelt) permite, através da razão comunicativa, recorrer à linguagem para argumentar contra ou a favor de certas patologias que a sociedade (pós ou trans) moderna possa apresentar. É através da fala do dia a dia que podemos introduzir "questionamentos" e fazer valer "aspirações de validade" (Geltungsansprüche) sobre a verdade das afirmações, a correção (Richtigkeit) das regras aplicadas e a veracidade do nosso interlocutor. Não é através da mentira sobre os fatos, do desrespeito às regras do jogo ou da falta de idoneidade moral que chegaremos a corrigir e a superar as crises de nossas sociedades. Em tribunais de pequenas causas já foi demonstrado que o entendimento pode ser obtido entre as partes conflitantes à base de bons argumentos, "abrindo o jogo" e não escondendo a verdade, não enganando o "outro" com mentiras e omissões, e respeitando as regras já comprovadas e democraticamente estabelecidas.
Habermas propõe lutar e corrigir a Modernidade. Antes de poder ser compreendida, será necessário desmontar visões equivocadas da Modernidade, como aquelas transmitidas pelos ensaios da "Spätphilosophie" de Heidegger, que falava sem rodeios do Nacional-socialismo como de um movimento "com uma verdade e grandeza intrínsecas" em um tom de "profeta incendiário". Nessa sua crítica e revolta contra Heidegger, o jovem Habermas já se perguntava:
Será possível que o assassinato planejado de milhões de pessoas, sobre o qual nós hoje todos estamos informados, ainda pode ser apresentado como um pequeno engano? Esse assassinato não seria um crime ("Verbrechen") factual daqueles que o cometeram - e a má consciência de todo um povo (o alemão)? Será que não bastaram esses oito anos que tivemos desde (1945) para que pudéssemos enfrentar o risco de um debate e o esclarecimento sobre aquilo que foi, que fomos? Não seria agora a nossa tarefa esclarecer essas ações e a nossa responsabilidade com relação a este passado?
Em 1987 Habermas conclui seu ensaio contido no "O Discurso filosófico da Modernidade" com a pergunta implacável: "Como Heidegger pôde compreender a história do Ser do movimento nacional-socialista como manifestação da verdade?" Já na "Introdução" para o livro de Victor Farias Heidegger und der Nationalsozialismus, (1987-1992), Habermas chega à convicção de que havia uma relação íntima entre a obra e a pessoa de Martin Heidegger.
Die Schwarzen Hefte 8
No final dos anos 1960, a editora Klostermann, de Frankfurt, comprou de Martin Heidegger os direitos autorais para a edição de uma Gesamtausgabe, ou seja, a edição completa de todos seus textos. No final de 2013, a editora e a imprensa livre surpreenderam o mercado livreiro divulgando uma nota segundo a qual a edição estava se aproximando de seus últimos volumes. A partir de 2014, apareceram nas livrarias os volumes 94, 95, 96, 97, 98 e, possivelmente, já estão sendo lançados os volumes 99 e 100, ainda no primeiro semestre do ano de 2015. Estes últimos volumes estão saindo da gráfica sob a responsabilidade de uma comissão presidida pelo professor Peter Trawny, da Faculdade de Filosofia da Universidade de Wuppertal, universidade à qual está vinculado o Instituto de Pesquisa Martin Heidegger. O anúncio de 2013 da editora chamou a atenção para um fato inesperado. Os últimos nove volumes contêm a transcrição de 34 cadernos de notas, que o próprio Martin Heidegger batizou de "Schwarze Hefte" (Cadernos negros). As anotações começam em 1931 e terminam com a morte de Heidegger em 1976. Esses cadernos tinham sido entregues aos editores com a ressalva de que somente poderiam ser publicados, no conjunto da Gesamtausgabe, depois da morte do filósofo, cuja família administrava o espólio do homem considerado o maior filósofo do século XX. Peter Trawny, o atual editor e conhecedor profundo das obras reunidas de Heidegger, deixou vazar algumas das mais chocantes passagens. Os textos já editados e impressos que chegaram ao nosso conhecimento (a público) confirmam todas as suspeitas sobre o colaboracionismo de Heidegger com os nazistas e todos os seus preconceitos raciais contra os judeus, aos quais passa a atribuir sem grandes rodeios a culpa de sua própria extinção nas câmeras de gás em Auschwitz. Nos tais cadernos, Heidegger reafirma sua concepção do "Führerstaat", glorifica o povo alemão, como eleito para salvar a Europa ("Abendland") esmagada entre o capitalismo anglo-saxônico e o comunismo soviético, declara o seu "Denken" como herdeiro da verdadeira filosofia, que teve suas origens nos pré-socráticos, idealiza o poeta Hölderlin, como o novo Messias, que, de certa forma, antecipou a vinda do Messias Salvador (Hitler). Enfim, Heidegger dá razão aos seus críticos e fornece os comprovantes explícitos de tudo que eles já haviam destacado à luz de sua obra anterior (impressa), entre os quais Theodor W. Adorno, Jürgen Habermas, Herbert Marcuse, Hugo Ott, Victor Farias, Emmanuel Fay9. O que antes era suspeita, agora é certeza! O próprio Heidegger fornece, sob forma de manuscritos (secretos), as "provas" autênticas de seu envolvimento com o nazismo, usando a filosofia para mascarar suas ambições de poder.
Quem esperava ler nesses Cadernos negros um antissemitismo aberto, agressivo, sangrento, implacável, como "prova" da culpa de Heidegger, ficará decepcionado; o leitor encontrará uma linguagem tipicamente nazista, com conotações que se perdem em qualquer tradução. "Volk" não é povo, "Seyn" não é ser, "die Bewegung" não é movimento e sim o movimento de "pensar, bem entendido, 'a verdade intrínseca do nacional-socialismo' ". Heidegger não é somente elitista, arrogante e sarcástico com quem não consegue seguir o seu pensamento, já que somente o seu pensamento é a verdadeira filosofia. É o pensamento de um megalomaníaco, que não dialoga com outras teorias, filosofias e ciências. Os Cadernos negros não trazem a redenção, a desculpa, esperadas, nem a busca pelo perdão pelos erros, como solicitado por Marcuse ou Habermas. Os Cadernos negros fazem em jargão nazista a glorificação do alemão como "povo herdeiro" da grandeza do pensamento grego da Antiguidade, mais precisamente do pensamento pré-socrático (Heráclito).
Os comentaristas do Feuilleton da Neue Züricher Zeitung, sempre muito comedidos, somente agora se assustaram com os termos usados por Heidegger em seus Cadernos negros, publicando manchetes como "O negro da alma de Heidegger", "Ainda é possível ler Heidegger?" "A última cartada do Mágico" e assim por diante. O semanário alemão Die Zeit reuniu em uma folha as versões mais explícitas e agressivas de Heidegger contra o que este chamou de "guerra do judaísmo mundial ("Weltjudentum") contra os alemães ou "Rachsucht" (surtos doentios de vingança), dos aliados, demonstrando a validade do mecanismo psíquico descoberto por Freud, da projeção, ou seja, projetar no outro as próprias animosidades, agressividades e desejos de morte.
O mundo acadêmico mostrou mais competência e cautela na condenação ou defesa de Martin Heidegger (1889-1976). O mais competente, ao qual tive acesso, pareceu-me o colóquio "Heidegger et les 'juifs' ", organizado no final de janeiro do ano de 2015, na Biblioteca Nacional de Paris, e do qual participaram integrantes da Universidade de Paris, da Universidade de Estrasburgo, da Casa da Irlanda, a TV Arte, entre outras...10
O filósofo Bernard-Henri Levy, no colóquio de encerramento do evento em Paris -"Heidegger et les 'juifs' " -, diferentemente do alarde da imprensa e das vozes ferozes contra ou até mesmo em favor da proibição da leitura da sua obra (como preconiza Emmanuel Faye), sugere que devemos incentivar essa leitura e promover o debate, fazendo-nos pensar sobre a razão de ser da filosofia e da sociologia. A controvérsia Heidegger versus Habermas é um bom começo para essa boa intenção.
Pós-escrito
Incluo aqui, a título de complemento e fonte dessa minha apresentação, algumas passagens dos Cadernos negros de Heidegger.
Citações de Heidegger do volume 94 dos Cadernos negros p.109 e seguintes:
Aforismas e epígrafes/fragmentos/glossário de termos tipicamente nazistas.
(1) A soberba vontade de um povo que desperta está dentro de uma grande escuridão mundial.
(2) A excepcionalidade do momento mundial cujo espaço sonoro deve fazer ressoar/ecoar a filosofia alemã.
(3) Mas para a filosofia devemos primeiramente amadurecer e este amadurecimento precisa primeiro preparar o solo, a tempestade, e o sol...
Das volkliche Geschehen (o acontecimento popular) poderia constituir um impulso nessa direção. Mas logrará alcançar esse objetivo? (o dinamismo inerente à força popular).
Pressionado para assumir o reitorado, agi pela primeira vez contra a voz interior. Nesse cargo, se o projeto se concretizar, eu poderia evitar, na melhor das hipóteses, isto ou aquilo. Para a construção - supondo que isto ainda seja possível - faltam os homens (Menschen).
Fragmento 9
Em cada combate, tornar-se mais seguro e mais flexível. O fracasso é um ensinamento. Havendo resistência, apertar os cinturões (arreios) com maior firmeza.
Fragmento 10
A grande experiência e felicidade que o Führer despertou, proporcionando ao pensamento o caminho verdadeiro e o impulso concretos. De outro modo, esse pensamento, apesar de toda a sua solidez, teria permanecido perdido em si, e dificilmente chegaria à realização. A existência literária acabou.
Fragmento 13
A nova coragem para assumir o destino "Mut zum Schicksal" como forma fundamental da verdade.
O encontro dos solitários (conspiradores?) só pode acontecer na solidão.
Fragmento 25
O Nacional-Socialismo só se transforma em um poder quando tiver atrás de todas as suas ações e afirmações ainda algo a silenciar, moldando o futuro com uma malícia. Mas se o presente fosse o já alcançado e o já querido, então sobraria apenas o horror ante a ruína (p. 114).
Fragmento 26
O Nacional-Socialismo não deve ser visto como uma verdade pronta e eterna caída do céu - assim compreendido, ele seria um erro e uma tolice.
Fragmento 29
O fim da filosofia: devemos levá-la a seu fim e com isso preparar o inteiramente outro - a meta política. Consequentemente ela é também a transformação da ciência (p. 115).
Fragmento 30
Necessitamos de uma nova concepção da universidade - que assegure politicamente uma liderança cultural (geistig). E para quê? Não para uma reconstrução e embelezamento do existente, mas para a destruição da universidade. Mas essa negatividade só se torna um agir quando tiver como tarefa uma nova educação (p. 116).
Uma tal concepção seria desprovida de sentido e nociva se se quisesse com sua ajuda fortalecer o existente e meramente adaptar-se aos novos tempos. Ela seria um meio de luta se o objetivo fosse preparar para a nova geração e sua verdade facilitando-lhe um caminho livre em que pudesse ser acompanhada por uma autêntica tradição.
A universidade de hoje é apenas um lugar de permanência provisório.
Fragmento 31
Endurecimento crescente no ataque.
Assegurar a supremacia em situações de emergência que ocorrem em situações de liderança compulsória, da obrigação de liderar (führen müssen) (p. 116).
Citações de Heidegger do volume dos Cadernos negros 97 (p. 68-69)
Hoje, 23 de janeiro de 1946, o reitor da Universidade me revelou que o Senado aprovou por unanimidade, no dia 20 de agosto de 1945, um requerimento meu (Heidegger) de aposentadoria precoce (Emeritierung), suspendendo, porém, minha atividade didática por um tempo indeterminado. Mais tarde, em caso de bom comportamento, essa suspensão poderia ser revogada e eu poderia retomar a minha atividade como professor. Ao mesmo tempo, foi-me aconselhado manifestar-me na "Offentichkeit" (espaço público), o que incluiria também possíveis publicações. A universidade tomaria medidas para que minha casa fosse poupada, para não impedir o meu trabalho intelectual. Não caberia a mim questionar com que direito tais medidas teriam uma base legal...
O Conselho Universitário não teve mesmo a coragem de me entregar um documento escrito, decidindo que o reitor me transmitisse, oralmente, essa decisão. Apenas informei ao reitor que eu não tinha nenhuma pretensão de exercer na universidade uma função pública ou comportar-me como um ressentido. Isso não corresponderia a uma decisão que só agora amadureceu de ausentar-me de tudo que tivesse a ver com ciência ou colegiado docente - mas sim a minha ausência se baseava em meu pertencimento enraizado na relação do meu pensamento com o Ser (ser como Seyn). A tentativa de dizer isto está incluída no aceno (Wink), texto que tem como título "Pensar".
O pensamento é a morada próxima, e o agradecimento silencioso... (os artistas cunharam o termo de "Innere Emigration")11.
* Aula inaugural na UnB/Sociologia, em 24 de setembro de 2015. O presente texto (aqui na íntegra) foi apresentado (sob forma reduzida) em minha posse na Academia Brasileira de Filosofia, Rio de Janeiro, no dia 29 de junho de 2015, ocupando a cadeira n.o 8, anteriormente ocupada por Benedito Nunes. Este texto está substancialmente modificado, mas nele se apoiam algumas ideias centrais do que vou desenvolver a seguir.
1. Cf. Rüdiger Safranski. Ein Meister aus Deutschland. Heidegger und seine Zeit. München-Wien: Karl Hanser Verlag, 1994.
2. Cf. Entrevista concedida à Univesp TV, disponível em: <https://www. youtbe.com/watchv =aoGfuUAKKU>.
3. Cf. entrevista do hoje catedrático professor Herrmann, no Philosophisches Quartett de Sloterdijk, 2011, na televisão alemã Zweites Deutsches Fernsehen. Das inúmeras biografias escritas sobre Heidegger, retomei as seguintes: (a) Walter Biemel. Heidegger, Bildmonographien. Hamburg: Rowohlt, Taschenbuchausgabe, 1973, em comemoração ao septuagésimo aniversário do filósofo. (b) Thomas Rentsch. Martin Heidegger: Das Sein und der Tod. Eine kritische Einführung. Münche; Zürich: Piper Verlag, 1989; (c) Rüdiger Safranski. Ein Meister aus Deutschland. Heidegger und seine Zeit. München-Wien: Karl Hanser Verlag, 1994.
4. Jürgen Habermas, Friedrich von Friedeburg, et alii. Student und Politik. Eine soziologische Untersuchung zum Bewusstsein Frankfurter Studenten. Neuwied: Hermann Luchterhand Verlag, 1961.
5. Theodor W. Adorno. Jargon der Eigentlichkeit. Zur deutschen Ideologie. Frankfurt/a.M.: Suhrkamp Verlag, 1964. A mesma editora publicou as obras completas do autor em vinte volumes (Th. W. Adorno. Gesammelte Schriften. Frankfurt/a.M.: Suhrkamp Verlag, 1972-1980). Ver também a obra conjunta com Max Horkheimer. Dialektik der Aufklärung, Philosophische Fragmente. Amsterdã: primeira edição pirata,1947.
6. Herbert Marcuse. Hegels Ontologie und die Theorie der Geschichtlicheit. Frankfurt: Vittorio Klostermann, 1968 (tese originalmente orientada por Heidegger).
7. Para Victor Farias (Heidegger e o nazismo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988) essa justificativa e desculpa nunca foram dadas (Farias, 1988: 374-375). O autor transcreve uma troca de cartas entre Heidegger e Marcuse, ex-aluno de Heidegger, que não deixam dúvidas quanto às atitudes cautelosas do mestre, depois de 1946, quando ambos discorrem sobre o envolvimento heideggeriano em favor do nazismo e seu antissemitismo disfarçado. Em carta de 20 de janeiro de 1948, Heidegger se justifica diante de seu antigo pupilo, já radicado em Berkeley, na Califórnia, com as seguintes passagens que cito abaixo: a. Eu esperava do Nacional-socialismo uma renovação espiritual da vida, um apaziguar das contradições sociais e uma salvação do Ocidente (Abendland) diante dos perigos do comunismo (o que tentara mencionar em sua "Rektoratsrede", durante a posse no cargo de reitor na Universidade de Freiburg) ... b. Em 1934, reconheci meu erro político e acabei pedindo demissão do cargo de reitor (um ano depois)... c. O senhor tem toda razão em criticar a falta de uma confissão publica minha contrária ao regime nazista ("Gegenbekenntnis"); mas isso teria sido a minha morte e a de minha família... d. Em meus cursos e em minhas aulas de 1934-1944, assumi uma posição tão inequívoca, que nenhum dos meus alunos (universitários) se viu forçado a aderir ao nazismo... o que os meus textos, uma vez publicados, comprovarão. e. Uma confissão depois de 1945 não me foi possível, pois os nazistas que aderiram ao movimento confessavam de um modo tão asqueroso essa sua mudança de atitude e mentalidade, que eu não queria identificar-me com eles. f. Diante de suas pesadas e justificadas acusações sobre o regime que matou milhões de judeus, que transformou o terror em normalidade, revertendo em seu contrário tudo o que se expressa nos conceitos verdade, liberdade e espírito, somente gostaria de acrescentar, que em lugar de "judeus" teria de estar escrito "Ost-Deutsche", valendo assim para qualquer aliado, com a diferença de que tudo que acontece desde 1945 se tornou público a todo mundo, enquanto o terror sangrento dos nazistas permaneceu segredo diante do povo alemão" (apud Victor Farias, Heidegger und der Nationalsozialismus, p. 374-375, tradução minha, BF).
8. Até agora (final do primeiro semestre de 2015) a Editora Vittorio Klostermann, em Frankfurt, publicou Mein Kampf (capa dura) em seis volumes, cada um contendo aproximadamente 400 páginas, com notas explicativas do editor Peter Trawny, no final de cada volume, e textos de segunda e quarta capa resumindo os procedimentos da transcrição, numeração e subtítulos de cada um dos 34 cadernos, como "Überlegungen" (reflexões), "Anmerkungen", (notações), "Winke" (indicações), "Vorläufiges" (provisórios), "Notturno" (noturno) etc.
9. cf. Hugo Ott. Martin Heidegger. Unterwegs zu seiner Biographie. Frankfurt; New York: Campus-Verlag, 1988; Emmanuel Faye. Heidegger: L'introduction du nazisme dans la philosophie (autour des Séminaires inédits 1933-1935). Paris, Albin Michel, 2005.
10. Na Alemanha, a Universidade de Siegen, a DFG organizou uma conferência internacional intitulada: Philosophia e Politica: Martin Heideggers schwarzen Hefte (22-25 de abril de 2015).
11. Ver: Siegfried Lenz. Deutschstunde. Berlin, DVT,1968.
Marco Florentino e Bárbara Freitag Rouanet
Enviado por Marco Florentino em 10/05/2018
Alterado em 24/12/2021