Marco Florentino
Em prosa e verso
Textos
A MEDIDA DO VALOR HUMANO
DA SÉRIE CONTOS CURTOS

CONTO NÚMERO 27

A MEDIDA DO VALOR HUMANO

            Cardiologista antigo em Belém do Pará, formador de incontáveis especialistas, Romário Conde, após tantos anos fazendo clinica e salvando vidas, sentia-se confortável, feliz e útil em seu consultório dedicando-se aos exames de eletrocardiografia, o qual era referência. Apesar da idade avançada, sentia-se rejuvenescido com sua atividade, motivo pelo qual ainda não pensava na aposentadoria plena.
            Ao lado da segunda esposa, companheira que realmente fazia jus a essa condição, vivia com seus três filhos adultos, todos bem criados e destacados nas carreiras que escolheram.
            Certa vez o irmão da sua nora, casada com o filho mais novo, lhe procurou após um fato inusitado: tinha acabado de iniciar o curso de medicina e foi chamado para atender uma senhora idosa que, devido a gravidade do quadro clinico, foi a óbito. O rapaz, inconsolável, achou que falhou no atendimento, mesmo não tendo passado pela cadeira de clinica médica, fundamental no curso de medicina. Sua chateação foi tamanha que pensou em desistir.
            Dr. Conde mandou chamá-lo e foi logo contando uma experiência que passou quando iniciava sua carreira de cardiologista. Fez um atendimento domiciliar a um cliente antigo e disse pra família, ao sair, que este viveria por longo tempo. Ao chegar em casa, sua companheira, meio que constrangida, comunicou que esta mesma família tinha acabado de telefonar informando sobre o infarto do paciente, o qual motivou sua morte.
            Dr. Conde enfatizou ao seu pupilo a imponderabilidade da medicina, pois trata de pessoas e estas são únicas, singulares em sua natureza e constituição. Qua a medicina não era matemática. O jovem estudante, mais tranquilo e conformado, continuou seu curso e tocou a vida.
            Algum tempo depois, morando e trabalhando como médico em Manaus/AM, soube que seu mestre e amigo estaria fazendo turismo na cidade, ficando hospedado no navio Catamarã que faz a linha Belém- Manaus- Belém.
            Feliz da vida tratou de recebe-lo para mostrar toda a cidade. Levou-o ao hotel mais luxuoso de Manaus, o Tropical na Ponta Negra, incrustado entre o Rio Negro e a Selva Amazônica. Ficou o tempo necessário para almoçarem. Depois do almoço, todo orgulhoso, o jovem médico foi passear de carro pela cidade, achando que tinha proporcionado, no hotel, o melhor programa para o iminente médico.
            De repente, ao passar num bairro pobre de periferia, muito popular da cidade, conhecido por Educandos, caracterizado por casebres que se estendiam no rio fétido e imundo sob forma de palafitas, pediu que parasse na famosa ponte que lhe dava acesso e uma visão panorâmica. O experiente médico saiu do carro e ficou longo tempo em silêncio admirando a paisagem. Ao voltar fez apenas um comentário: - Isso aqui valeu toda a minha viagem.
            O jovem esculápio ouviu calado e calado ficou. Não se atreveu a perguntar nada, somente pensou... mais uma lição aprendida.

Marco Antônio Abreu Florentino

https://youtu.be/SJSeYOLPnX4
(Paratodos - Chico Buarque)
Marco Florentino
Enviado por Marco Florentino em 26/03/2018
Alterado em 26/03/2018
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