Marco Florentino
Em prosa e verso
Textos
NESTA MESA TÁ FALTANDO ELE
DA SÉRIE CONTOS CURTOS
CONTO N° 12
NESTA MESA TÁ FALTANDO ELE

          Nascido caipira no norte velho do Paraná, compartilhava com outros quatro irmãos machos a vontade do pai em torná-los padres, entretanto, o seminário era demais pra meninos que tinham na liberdade seu maior valor pueril.
          Eram tantas as brincadeiras e aventuras naqueles vastos campos inexplorados, com seus pés de serra iniciando as lavouras de café, os carros de boi anunciando suas presenças com as cantadeiras atreladas aos cabeçalhos, assim como os trilhos de uma inovada ¨Maria Fumaça¨, que guardaram tais lembranças enquanto viveram, evocando-as sempre que se encontravam, para deleite de suas famílias que adoravam ouvir tantos ¨causos¨.
          Mas como a vida tem que seguir sua regra dialética, o inesperado aconteceu: o pai deles morreu precocemente quando ele contava doze anos. Começou aí a saga dos irmãos, que se mudaram pra São Paulo a fim de lutarem por suas vidas. Ironicamente, ao invés de padres, todos tornaram-se militares e com muito sofrimento e sacrifício venceram, cada um ao seu modo.
          Ele, por ter ingressado na aeronáutica, saiu de São Paulo para o mundo. Com energia renovada nunca se abateu. Com inteligência e sagacidade, se desenvolveu e com espírito elevado e fé em Deus, sempre cresceu.
          Formou-se oficial, depois professor e posteriormente cursou engenharia. Casou no nordeste e teve cinco filhos, tendo passado pela terra do ¨Tio Sam¨ onde teve uma filha. Conquistou diversos amigos sendo um homem simples e autêntico.
         Era místico ... frequentava a maçonaria e a doutrina espírita. Acreditava na numerologia e outras coisas invisíveis. Separou da primeira mulher depois de trinta anos de convivência e casou de novo. No total teve oito filhos, tendo apego por todos mas talvez maior afinidade com o terceiro filho do primeiro casamento, formado em medicina e filosofia, porém, ao contrário dele, um cético convicto.
         Nas inúmeras vezes que se encontraram para ver o pôr do sol e jogar conversa fora numa mesa de cerveja, o filho médico brincava dizendo que ele iria morrer de parada cardíaca, afinal era portador da doença de Chagas, herança do interior. Pedia apenas para que não morresse num sábado, pois era o dia do encontro semanal.
         Morreu num sábado, de parada cardíaca, às duas horas da tarde do dia 02/02/2002, aos 72 anos.
         Hoje, aos sábados, quando o filho vai beber em companhia da mãe, sempre comenta: -¨Nesta mesa tá faltando ele e a saudade dele está doendo em mim¨.

Marco Antônio Abreu Florentino
Marco Florentino
Enviado por Marco Florentino em 16/06/2015
Alterado em 28/08/2022
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